Sucesso sobre rodas.

Esta reportagem foi integralmente retirada de uma revista Noticias Sábado dos anos 00. O texto e as fotos são da responsabilidade de José Vinha

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Depois do desaparecimento da Famel, da Casal ou da Vilar, a única marca portuguesa de motos continua a ser produzida por uma jovem equipa do Vale do Sousa. A AJP até já captou a atenção da Agência Portuguesa para o Investimento.

 

À primeira vista, é um simples pavilhão industrial alinhado a tantos outros que compõem a nova zona industrial de Lousada, no Vale do Sousa. Corre-se o portão e aparece uma placa azul com a inscrição AJP. Haverá algum segredo a desvendar além deste biombo improvisado? Ou é apenas uma barreira opaca para impedir o olhar curioso dos transeuntes? Talvez as duas coisas...

No interior, uma área coberta de 1200 metros quadrados, funciona a única fábrica portuguesa de motos, que emprega 12 operários. E até seria uma vulgar empresa, se não fosse o seu estatuto de sobrevivente, depois do encerramento de grandes unidades industriais como a Casal, a Vilar, a Macal, a SIS Sachs, a Famel e tantos outros símbolos das duas rodas que se desmoronaram nos anos 80 como um jogo de dominó. A AJP (iniciais de António e Jorge Pinto) resistiu ao terramoto e, passados vinte anos, continua a conquistar o mercado internacional e nacional.

É uma típica história de sangue, suor e lágrimas. António Pinto, de 43 anos, sócio - gerente da AJP, guia-nos pelo interior da fábrica, mostrando-nos a linha de montagem. Como num jogo de legos, sobre diversas bancas de trabalho estão alinhadas as peças para encaixar: quadros, forquetas, suspensões, conta-quilómetros, faróis, rodas, pneus, parafusos e ferramentas. Cada operário tem uma tarefa a cumprir e cada unidade é testada, aparafusada e ajustada ao pormenor.

No departamento de "design" e desenvolvimento, Miguel Oliveira, 34 anos, engenheiro e sócio da empresa, não larga o computador. Ensaia o modelo da nova criação: a AJP PR3 200. O desenvolvimento do projecto demorou cerca de um ano e contou com a parceria do Centro para a Excelência e Inovação na Indústria Automóvel (CEIIA), sediado no parque de Ciência e Tecnologia da Maia- ajuda preciosa na prototipagem rápida-, e o Instituto de Engenharia Mecância e Gestão Industrial da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, que desenvolveu um sistema de telemetria para a realização de testes dinâmicos.

No sector da produção, um operário solda um chassis, um outro opera no torno mecânico e um terceiro executa a maquinação das traves laterais em alumínio. O teste do motor parece ser a tarefa mais demorada. Mas as atenções estão agora centradas na dureza da espuma do banco da nova moto. Os moldes, desenhados e realizados pela AJP, são ajustados para a produção em série.

 

 

 

 

 

A AJP PR3 200 já tem uma encomenda de 100 unidades e as revistas da especialidade anunciaram o evento, mas na fábrica ainda há pequenos aperfeiçoamentos a fazer antes da produção em série. Os protótipos foram testados e o modelo pilotado por dezenas de jornalistas nacionais e estrangeiros. Os testes comparativos com outras marcas colocam o modelo nas primeiras preferências, reconhecendo-lhes fiabilidade e conforto. O ambiente é, portanto, de optimismo já que a AJP PR3 200 é uma moto com 3 versões: motocross, enduro e circuito urbano.

 

 

A PR3 200 não é a primeira moto desenhada, planeada e produzida pela AJP. Em 1988, António Pinto, então com 23 anos, apresentou a AJP Ariana 125, modelo robusto para provas de enduro e motocross, produzido em pequenas oficinas de Galegos, Penafiel. A invenção foi baptizada com o nome da filha mais velha de António Pinto. Para afirmá-la no mundo da competição, o jovem criador decidiu participar em várias competições em Portugal. Obstinado, sagrou-se campeão nacional. No entanto, nem esse facto parecia convencer o mercado. O objectivo era encontrar uma parceria capaz de produzir modelos Ariana em série, mas as grandes fábricas olhavam com desconfiança.

Em meados de 1996, nasceu a AJP Galp 50 e dois anos depois surgiu a segunda versão desta máquina, financiada pela petrolífera

 

 

O modelo urbano de uma motorizada de 50cc despertou a atenção do mercado e, finalmente, a Casal, com sede em Aveiro, admitiu fazer uma parceria para produzir a AJP Galp 50. O negócio chegou a estar alinhavado, mas um forte revés deitou por terra todos os sonhos. "Quando começamos a construção do protótipo da Galp 50, propusemos ao Dr. Neves Ferreira, administrador da Casal, se havia interesse da marca em produzir o modelo que estávamos a construir. Ele mostrou-se interessado e, três meses depois, chegámos a um acordo: a Casal produziria a moto, uma vez que a AJP não tinha grande capacidade. Na época, este tipo de modelo vendia milhares de unidades por ano no mercado europeu", relembra António Pinto. "Após o acordo, fomos almoçar e quando regressámos, o dr. Barros Vale, na altura  presidente do conselho de administração, simplesmente anulou o negócio. Penso que terá sido por por pressão de pessoas que trabalhavam na Casal e que desconheciam a realidade do mercado e do potencial desta moto."

Apesar deste revés, a AJP produziu 500 e colocou-as no mercado nacional. Com cinco títulos consecutivos de campeã nacional de Enduro e quatro títulos de campeã nacional de todo-o-terreno, a Galp foi a primeira moto 50cc do mundo a concluir os seis dias de Enduro (International Six Days of Enduro) em 1999.

Quando se preparava para o mercado internacional, a Casal fechou. Manter a AJP começava a ser ainda mais difícil. António Pinto não baixou os braços e desenvolveu então a AJP PR4 Enduro e Supermoto. Ao mesmo tempo foi aperfeiçoando modelos e inovando no design das máquinas, sendo possível colocar na linha de montagem 1100 unidades.

 

 

Passados quase 20 anos desde a concepção do primeiro modelo, a AJP deu o salto maior ao desenvolver a PR3 200, um projecto ao nível das exigências mundiais do mercado actual. As primeiras seis unidades da nova AJP PR3 200 MX, em duas versões (todo-o-terreno lazer e todo-o-terreno pro) já foram testadas e apresentadas publicamente perante jornalistas que se deslocaram a Penafiel. "A vantagem desta moto é a dimensão. Não tem o tamanho habitual dos tradicionais modelos de motocrosse, é mais leve, mais pequena e de fácil condução", explica Miguel Oliveira. "A AJP PR3 200 MX teve junto dos importadores e representantes um excelente impacto e foi uma verdadeira surpresa". assegura André Loureiro, director comercial.

"Os utilizadores de menor estatura, principalmente as mulheres, sempre tiveram grandes dificuldades em encontrar uma moto em que se sentissem confortáveis, por isso uma mais pequena e de fácil utilização. Este foi o ponto de partida através do qual se começou a dar vida à à nova AJP", acrescenta.

O sonho acalentado pelos jovens já chamou a atenção da Agência Portuguesa para o Investimento (API). O presidente da API, Basílio Horta, participou, há cerca de um ano, numa conferência em Penafiel e revelou interesse pela história da marca. Entretanto, vários estudos financeiros foram desenvolvidos para obter apoios para o projecto. A concretizar-se, criará no Vale do Sousa o primeiro e único "cluster" da indústria de motos nacionais.